terça-feira, 31 de março de 2015

Demorou, mas já é

Tudo começa na mente.
Minha mente foi extremamente beneficiada pelos retiros de janeiro e fevereiro, com Alan Wallace e Lama Padma Samten.
E é a isso que atribuo todas as mudanças que fiz desde então.
Os retiros propiciaram clareza. E geraram mérito para a remoção de obstáculos.
E bota remoção de obstáculos nisso: tudo que estava emperrado e estagnado andou (o movimento foi bastante doloroso em alguns momentos), tudo que era tóxico se dissipou.
Movimento.
Abertura.
Luz.
Ar fresco.

Mas teve algo ainda mais essencial que os retiros. A base interna.
Um pouco antes dos retiros, eu havia consolidado a prática da meditação diária.
E é isso que está mudando tudo pra mim. A meditação desencadeou uma onda luminosa que se expande por tudo.
O efeito mais notável é o foco, a organização.
Minha vida estava frenética e caótica. Muita correria e pouca rapidez. Dispersão geral.
A modesta prática meditativa está ajudando a diminuir o tumulto. É uma coisa tão pequena, mas tão espetacular.
Os efeitos são mais visíveis no trabalho e nos treinos.

A relação com o trabalho mudou. Toda ela.
Voltei a ser produtiva. Depois de anos da mais completa desorganização, acabaram-se os atrasos.
Não foi fácil. E tive dois grandes revezes antes de conseguir chegar ao ponto em que estou hoje, agora, no último dia de março.
As duas últimas semanas foram extremamente difíceis. Me vi sem perspectivas. Tive um momento de pânico. O que vou fazer agora? Regina, minha tutora, me tranquilizou: "Você tem muito mérito. Encare como férias, tire férias. Logo vai surgir algo".
Nem cheguei a ter férias. Mas desacelerei, descansei.
Me dediquei à finalização de um trabalho e fui buscar novos. Continuo buscando. E o primeiro já apareceu. E não poderia ser melhor.
Uma tradução budista. Um livro maravilhoso, de uma grande personalidade do Dharma, para uma editora com a qual tenho uma conexão de dakini. É uma nova modalidade de parceria.

Na corrida:
91km em janeiro
108km em fevereiro
226km em março

Em um mês, mais do que a soma dos dois anteriores.
Motivação é tudo.
Finalmente recuperei o prazer e o foco perdidos lááááá na sensacional maratona de 2013, que só não foi melhor porque o processo descendente começou um mês antes.
O que aconteceu comigo pra parar de correr direito não sei.
Mas sei o que aconteceu pra eu voltar: decidi resolutamente que voltaria. (Já havia decidido várias vezes, mas sempre fracassava, sucumbindo à confusão samsárica e me desorganizando. Simplesmente a vontade não resistia às pressões.)
No dia em que fui conversar com Leo Ribas na Sogipa, cheguei lá com o propósito de retomar o treino, de seguir a planilha. De fazer a coisa direito. E sem cobrar de mim mesma nada além disso: treinar direito, seguir a planilha. Abandonei as expectativas de voltar a correr como antes. E não estou pensando em competir.
Antes eu tinha ideias semelhantes, mas elas não eram claras o bastante. Eram inconsistentes. Desfocadas.
A mente clareou, o corpo começa a reagir. E está sendo 

E tem mais.
A interação social.
Um amigo muito querido morreu aos 44 anos, e isso me fez lembrar da importância de manter contato com as pessoas de quem se gosta.
Fui em busca de velhos e novos amigos.

Desintoxicada. Purificada. Leve. Focada.
Muito mais está por vir.

sábado, 28 de março de 2015

Acareação

Ele disse, ela disse...
Para acabar com o disse-me-disse, nada mais fácil do que perguntar diretamente.
Nada como exercitar o saudável e cada vez mais incomum hábito de falar a verdade francamente: "Eu fiz, eu disse, não fiz, não disse". E perguntar sem rodeios: "O que você falou? Você disse isso e isso? Você fez ou não fez?".
No fim de uma sessão de sinceridade, constata-se que a mentira tem pernas minúsculas quando se decide falar e ouvir a verdade. E se descobre quem falseou onde.
Aí é fazer a faxina e botar a vida em ordem.

Os estágios da putice

Primeiro, um puta choque.
Depois, uma puta raiva.
A seguir, uma puta tristeza.
Para resumir: uma puta decepção.

No fim, um puta alívio.

sexta-feira, 27 de março de 2015

Bom dia!


Sexta-feira, sua linda!
O céu amanheceu cor de rato, esfriou, tem um ventinho. Friorenta que sou, já me puxei numa manga longa pra treinar daqui a pouco mais.
Antes, o tradicional balde de café com leite e achocolatado.
Semana cheia chegando ao fim. Conclusão de um trabalho. Encerramento de uma outra parceria profissional que desde o início tinha uma qualidade de instabilidade. Troca de treino de musculação, reajustado para a retomada da corrida, que, aliás, segue lindamente.
A transição do verão para o outono, a virada de ano astrológico trouxeram enormes mudanças.
Até no guarda-roupa, já que essa combinação de vermelho e branco nunca foi a favorita, hehehe. Gremistas entenderão.
A reviravolta no trabalho causa insegurança, mas ao mesmo tempo alívio. E a certeza de que, como tudo, é para melhor.

quinta-feira, 26 de março de 2015

O mural das lamentações - e das farpas

Sabe aquela vontade de bisbilhotar o Facebook e Instagram alheios? Pois é, nunca tive.
E fico pasma com a quantidade de tempo que as pessoas se dispõem a gastar nisso.
No ano passado, minha filha foi assediada por uma stalker que adicionou a mim e mais um monte de amigos dela no FB. Depois postou fotos da minha filha como se fosse ela. Vai saber por quê. Ignoramos solenemente, aí passou.
As criaturas ficam vasculhando a vida de pessoas que mal lembram que elas existem, postam indiretas que os alvos não leem, expõem seus ressentimentos e rancores sem o menor senso de autopreservação. É bem a história aquela de tomar veneno e esperar que o inimigo morra, ou segurar carvão incandescente pra jogar no outro.
Tem muitos, muitos casos de pessoas que se envolvem nesses relacionamentos neuróticos via rede social. É um jogo de provocações mútuas. Tem quem goste. Aí é todo mundo tomando veneno e jogando carvão. Eita!
Meu Facebook e meu Instagram são públicos (assim como o blog aqui), me recuso a impor restrições pra evitar a bisbilhotice. O que eu faço quase todo dia é tirar do feed as pessoas que não me interessam e/ou postam coisas que prefiro ignorar. Funciona lindamente. Não tomo conhecimento de gente que pode me perturbar.
Para mim, ainda mais espantosos que os catadores da vida alheia são os que destilam veneno em comentários em notícias, posts nas redes sociais e até no YouTube!
Tenho ouvido muita música via YouTube. Música clássica. E fico totalmente perplexa ao deparar com comentários detonando o artista, ou dizendo que fulano toca aquilo melhor. WTF?
Nas notícias é pior ainda. As pessoas vomitam todo tipo de desaforo, brigam entre si, uma fúria e uma troca de ofensas generalizadas.
Tô evitando totalmente esse tipo de comportamento. Meu Facebook está cada vez mais budista. Como eu. Só que a budista aqui ainda não é lá um primor de equanimidade e compaixão, por isso evito tomar contato com as perturbações. Pra não me enganchar.
Porque esse festival de gente ressentida, bisbilhoteira e raivosa às vezes cansa, ah, cansa!



segunda-feira, 16 de março de 2015

PerCorrer o Caminho do Meio


Depois de um janeiro e fevereiro turbulentos, março está engrenando bem.
Uma sensaçãozinha que eu sentia nos joelhos desde outubro, talvez um pouco antes, acabou se transformando em desconforto após os dois retiros budistas, com horas sentada no chão de pernas cruzadas. E, na última semana de fevereiro, o joelho direito realmente doeu.
Feita a ressonância, consultado um especialista, e eis que descubro que tenho condromalácia de grau 2 para 3 nos dois joelhos. O que fazer? Tomar medicação de uso contínuo, cuidar o amortecimento dos tênis, correr em piso macio sempre que possível, caprichar no reforço muscular e no ALONGAMENTO. O médico afirmou que minha lesão é da corrida, falou que não iria me dizer para parar de correr, mas é claro que tem a possibilidade de isso se tornar obrigatório. O que pode acontecer é a dor se tornar crônica e intensa. Aí deu.
Espero que não aconteça no futuro imediato. Aos 51 anos, não preciso pensar na carreira de corredora a longo prazo. Na real, da forma como cada vez mais vejo a existência, não há motivo para pensar em nada a longo prazo. O que evidentemente não significa viver como se o mundo fosse acabar amanhã. É uma sintonia fina para ficar no presente, no agora. No presente, no agora, vou cuidar pra não destroçar meus joelhos, pra me manter saudável. E, de momento presente em momento presente, o tempo avança.
No momento presente, no agora, estou bem. A dor passou, as sensações nos joelhos são muito leves.
Estou treinando bem desde o início do mês. Curtindo muito o trabalho do Leonardo Ribas, do PerCorrer. A primeira metade do mês foi com planilhas semanais. Cheguei lá, expliquei a situação toda, e ele propôs um trabalho de base. Começar muito de leve, pra ver como meus joelhos reagiriam - e o resto de mim, que estava totalmente fora de forma. Os joelhos, os trabalhos, os retiros, o cansaço e, acima de tudo, a falta de vontade e o desinteresse (alimentados pelos anteriormente citados) haviam transformado meus treinos num tédio, uma atitividade burocrática e exaustiva que eu executava sem prazer.
O primeiro treino de pista, no dia 4, foi memorável. 4x 800m. Totalmente insegura, desacostumada. E já no primeiro tiro começou uma chuva que se transformou num aguaceiro furioso. E eu lá correndo (tentando), encharcando o corpo e lavando a alma. Que estreia! O quinto tiro foi suspenso porque a água já estava bem acima do tornozelo numa curva da pista. Sorte minha, eu já estava morta.
Aquela chuvarada foi um banho de descarga. Voltei pra casa leve, animada. Cada treino depois daquele está sendo um pouquinho melhor, um pouquinho mais fácil. E, com os joelhos bem e os trabalhos encaminhados. menos cansada, com vontade e interesse, os treinos tornam-se estimulantes e prazerosos. O de hoje foi especialmente bom.
Para manter a coisa andando sem solavancos, por enquanto é só treinar por treinar. Leo perguntou quais eram meus objetivos. Eu disse que não tinha nenhum, que queria apenas treinar e ver o que acontecia. E que esperava dele o que sempre espero do treinador: que pense e planeje por mim, Vejo o treinador como um especialista que pode me orientar e preparar para um desafio dentro da minha capacidade (ou seja, a voz do bom senso). Mas - hehehe, sempre tem um "mas" - vi a movimentação do PerCorrer pra maratona, e perguntei se ele achava que eu poderia fazer. Claro que não. Não que eu não soubesse, mas a ideia de jerico brotou assim mesmo - e já foi extirpada.
Pra voltar a fazer uma maratona, tenho que estar bem não só de corpo, mas de cabeça. E Leo acha que, se eu inventasse uma maratona agora, o que ia dar mais problema era a cabeça. Concordo. Essa periga levar mais tempo pra entrar em forma. Daí a imprtância de ficar no treino "sem compromisso". Sem forçar. Pra terminar o treino feliz e satisfeita como terminei hoje, com vontade de fazer o próximo.

domingo, 1 de março de 2015

A moeda é mérito

Retomei a atividade de preparação de textos do Lama Padma Samten após o retiro de verão. Lá conversei com Stela Santin, a gestora do Cebb, sobre meu desejo de contribuir para a divulgação dos ensinamentos do lama. E entrei para a força-tarefa que posta os ensinamentos no site do Cebb e nas páginas do Cebb no Facebook.
O primeiro fruto desta atividade está aqui:

http://www.cebb.org.br/a-moeda-e-merito/

E agora, ao postar aqui, caiu a ficha: que incrível "coincidência" o primeiro texto referir-se a trabalho e geração de recursos.
Cá está ele:

Os méritos movem o mundo
A questão do sustento do praticante é um tema muito importante, que de modo geral surge como um obstáculo. O meditador começa a praticar, a energia dele começa a se mover, e aí, no trabalho, ele se vê dedicando toda a sua energia para construir coisas que nem quer que sejam construídas. Como escapar disso? Afinal, é preciso pagar as contas.
Existe uma sensação de que temos um mundo regido por leis econômicas e por funcionamentos lógicos, que temos que pagar um preço para poder viver dentro dele e assim conseguir praticar o Dharma como uma coisa acessória, lateral. O praticante gostaria que o Dharma fosse o principal, mas não consegue fazer isso porque, afinal, é obrigado a fazer coisas para pagar as contas.
Mas existe um jeito de mudar isso. O processo é o seguinte: é essencial aprender a gerar méritos. Não precisamos gerar reais, nem dólares, nem euros, precisamos gerar méritos. A moeda é mérito. Esse é o ponto. O funcionamento do mundo se dá por méritos. Podemos ver o funcionamento econômico, mas isto é uma pequena parte do todo. Não nos damos conta de que a moeda é mérito.
Geração de méritos significa o quê? Que estamos fazendo alguma coisa positiva e aquilo está melhorando a vida dos seres em alguma direção. Se fizermos o contrário, pode perdurar por um tempo, mas tem uma hora em que afunda. A forma como vivemos gera impacto sobre nós mesmos. Melhor gerar méritos em vez de gerar carmas.
Vamos supor que estamos empregados em uma organização e aí pensamos: “Estou trabalhando só para ganhar dinheiro”. É melhor que estejamos beneficiando todos ao redor e que nossa função também seja benéfica para as pessoas de fora. Se não for, que seja ao menos neutra, mas que não seja uma função negativa, que vá causar problemas. Porque neste último caso, mesmo que você tenha sustentação econômica, haverá um momento em que aquilo ali vai ser derrubado. Por quê? Porque começamos a fazer ações cármicas, os seres atingidos começam a gerar “anticorpos” para essa ação. Haverá um momento que eles irão ter sucesso e nos derrubar. Então é melhor termos uma atividade econômica ligada à geração de méritos.
Com as empresas é a mesma coisa. Não é uma questão econômica simplesmente. Se uma empresa está gerando obstáculos, gerando dificuldades para as pessoas, ela vai ser atingida por estar gerando carmas e não méritos. Não importa o tamanho da empresa, se não gerar méritos, um dia vai quebrar, ou vai ser fechada, ou vai surgir algum problema. Isso é certo, é matemático. Se o McDonald’s quiser sobreviver, vai ter que melhorar a qualidade dos lanches, vai ter que produzir uma coisa cada vez mais natural, com certeza.
Para gerar mérito é preciso exercitar a sabedoria: entender os seres no lugar onde eles estão (pelo ponto de vista deles, não do nosso), se alegrar com as coisas positivas que os outros vivem e ser um instrumento para isso, entender as limitações inevitáveis da vida e das coisas, evitar as ações causais que vão produzir problemas, promover as ações causais que vão produzir coisas boas, ter estabilidade de não se perturbar diante dos problemas, ter a capacidade de pacificar as situações aflitivas que os seres experimentam, ter a capacidade de promover as qualidades positivas que eles têm, ter a capacidade de interromper a negatividade aflitiva sobre os outros e entender que a nossa natureza é o aspecto secreto e se move assim. Aí está tudo resolvido. É só fluir. Esse é o bodhisattva, ele anda pelo mundo sem problema.
Com essa sabedoria, fazemos uma lenta migração para o modo de vida do bodhisattva. Podemos dizer: “Bom, é assim, sou um bodhisattva operando como caixa no Banco do Brasil”, “sou um bodhisattva atuando como promotor público”, “sou um bodhisattva atuando como oficial de justiça” — como policial, como carcereiro, como médico, como psicólogo, como psiquiatra.
Não é preciso uma atitude radical do tipo: “Vou pedir demissão e aparecer lá pelo Cebb”, melhor não. Não peça demissão, continue no lugar em que está, mas treine a geração de méritos. Você fica no mesmo lugar, só que a atividade agora é outra, não é a geração de recursos, agora é geração de méritos, você está ajudando, está verdadeiramente melhorando o ambiente ao redor e produzindo os benefícios possíveis. Com o tempo, você vai se sentir hábil ao andar em qualquer lugar porque vai gerar méritos.
Minha sugestão é esta: não peça demissão de coisa alguma, aproveite o lugar em que está para testar isso, comece a gerar méritos nesse lugar. Melhore tudo que você está fazendo, melhore as relações em todas as direções. A vida vai ficar muito mais feliz. Essa felicidade já é a manifestação de bodhichitta.