sábado, 7 de junho de 2014

Os valores que não têm preço

A honra, a palavra dada, o compromisso firmado, a parceria. A amizade, o carinho, a vontade de fazer o outro feliz sem esperar nada. O respeito e as homenagens a quem merece. A solidariedade no sofrimento. Várias coisas me fizeram refletir hoje sobre esses valores que não têm preço.
Sabadão. Noite. A pessoa chegou de 18km de corrida. Distância que não fazia desde 31 de agosto passado; fiz 20km naquele sábado, e desde então o máximo havia sido 16km, em poucas oportunidades. O que mostra o quão pouco tenho corrido, o quanto perdi o embalo - e explica a fraqueza atual.
Simplesmente não consigo mais desenvolver velocidade. Tem a idade. A menopausa. O stress bombástico. E tem a falta de foco no treino. Desde a maratona do ano passado eu larguei de mão. Aí não vai.
Só que agora tenho um objetivo. E um objetivo muito bom, pois não é pessoal. Me comprometi a acompanhar uma amiga em seu treino pra uma maratona. Não vou fazer a prova, só vou treinar junto. A ideia era eu dar ritmo; porém, como estou uma lesma, farei apenas a parceria de sair junto e fazer a mesma distância e os mesmos tiros de pista, mas cada uma na sua velocidade. Promessa é dívida. Aí não tem fazer corpo mole ou largar de mão. Não é uma maratona minha, não é um sonho meu. Não posso abortar a missão. Palavra dada é palavra cumprida.
Cheguei, tomei banho, meti o pijama e ia fazer uma massa, com o Led Zeppelin bombando - porque a revisão de estilo de Robert Plant: A Life me deixou em surto de novo -, quando toca o interfone. Atendo e ninguém fala nada. E fica tocando. Fui olhar na janela, certa de que não era comigo. Era! Era a Adriana Schnell. O interfone não está funcionando porque algum vizinho deixou fora do gancho, affff. E a Adri, só pra variar, não estava com o celular (quando está também não adianta muito, porque ela deixa no silencioso, então não atende). E lá estava ela no portão, com um prato da lasanha vegana que ela tinha postado no FB, e eu tinha ficado elogiando e cobiçando. Ela veio trazer um pedaço pra mim. Pra mim!
O que dizer de uma amiga assim? Como agradecer? Como expressar a felicidade que se transborda, a alegria que se irradia? Ter amigos como a Adri faz de mim uma pessoa melhor. Porque pessoas do bem me contagiam. Aí meu bom coração bate mais alto, mais rápido, mais forte. Eu entro na corrente do bem. De querer bem, de desejar o bem e fazer o bem (de preferência sem diferenciar ninguém, mas isso é mais teórico do que prático).

E a lasanha? Uma delícia. Uma das melhores lasanhas que já comi na vida. E com certeza a mais saudável. Comida vegana bem preparada é simplesmente dos deuses. Menos é mais. Caminho do meio. Equilíbrio.
Então, enquanto eu aquecia a lasanha e jantava, concluí que precisava registrar esse momento aqui. Porque é um daqueles momentos em que eu vejo o que me interessa com muita lucidez.

Este sábado começou muito triste com a notícia da morte de Fernandão, ídolo do Internacional. Como gremista, eu detestava o Fernandão e o que ele representa. Detestava, mas não muito. Eu torço pelo Grêmio, mas não torço contra o Inter, tenho amigos colorados demais para isso e sou totalmente adepta do "que vença o melhor", eu aprecio e reconheço a superioridade dos que vencem por seus méritos e talentos. Ao saber da morte trágica e tão absurdamente prematura, fui tomada por uma imensa tristeza. Meu bom coração solidarizou-se com a família, com a torcida colorada e lamentou sincera e profundamente a morte de um grande atleta, um vitorioso e, acima de tudo, um homem de caráter, uma pessoa do bem. Uma pessoa tão luminosa que, na morte, gera uma onda de paz, de solidariedade, de empatia, de bons sentimentos. Eu e muitos, muitos gremistas estamos tristes, chocados, de luto e totalmente solidários com a dor dos colorados. Somos um na perda, na dor, no luto.
Todos que lamentam a morte de Fernandão tornam-se pessoas um pouco melhores, porque o coração abranda, a mente sai do eu-meu-pra-mim e volta-se para o outro, desejando que Fernandão descanse em paz e que sua família possa ficar bem. Homenageamos o morto para que ele saiba mais uma vez o quanto era amado e respeitado. E nos lamentamos e nos consolamos mutuamente, nos aproximamos uns dos outros para trocar energias reconfortantes. Agimos de coração, movidos pelo que temos de melhor em nós: a bondade amorosa, o desejo desinteressado pela felicidade de todos, que costuma ser soterrado pelos venenos da ignorância, do apego e do desejo/aversão, por tudo que nos separa e nos diminui e amesquinha.


Antes da corrida e da lasanha, teve a visita a minha mãe. Que está bem no que pode estar bem. O Ângelo, fisioterapeuta da clínica, estava lá, e conversamos sobre o jogo de vôlei que ele organizou com as moradoras. Minha mãe foi um dos destaques. Apesar do avanço devastador da doença, ela mostrou coordenação motora e mental na atividade. Ouvir o relato dele foi tão bom. E ouvir os planos dele, de um profissional comprometido e um ser humano bondoso, que levava minha mãe para comer pãezinhos numa lanchonete perto da clínica, foi ouvir uma canção do bom coração sobre os valores que não têm preço.