terça-feira, 10 de outubro de 2017

Border life

Muito, muito mais estável.
A resperidona deve ter contribuído, mas creio que o principal foi ter um diagnóstico. A constatação de que a disfuncionalidade não é uma simples veneta ou falta de empenho para mudar.
Quando me pego em reações exageradas, lembro do transtorno de personalidade borderline. E penso: "Ok, tenho essa característica. Mas vou maneirar. Eu tenho isso, mas sou maior que isso, sou mais que isso". Consigo ter mais paciência e boa vontade comigo mesma. Não sou assim porque quero, não é uma escolha e não é voluntário. A escolha voluntária que fiz é me tratar para administrar as oscilações.
Resperidona me dá sono, reajustamos a dose pra mera 1mg.
O equilíbrio é frágil. Preciso tomar certos cuidados. Dormir direito, comer direito, beber pouco, evitar estresse e fadiga mental e/ou física excessiva. Essas alterações afetam todo mundo, é claro, mas no meu caso podem levar a uma exacerbação de sentimentos e sensações perturbadores e negativos. Se fico cansada demais, começo a achar tudo dramaticamente terrível - na vida prática e emocional.
Procuro me resguardar, ficar longe de situações e pessoas que possam me desestabilizar. Nem sempre é possível. Nem tudo depende de mim. Algumas situações simplesmente escapam do que desejo e tento realizar. As atitudes dos outros não são controladas por mim, às vezes não há como me livrar de gente desrespeitosa e/ou invasiva. Exposta ao que me desestabiliza, vêm as ondas de frustração e fúria, às vezes de dor e tristeza (especialmente quando não consigo não sentir e/ou pensar o que não quero sentir e/ou pensar). Como toda onda, essas passam.
Talvez eu jamais consiga não produzir essas intensas ondulações mentais/emocionais. (Sim, elas são uma produção de minha mente, de uma parte de minha mente, elas não vêm "de fora", vêm "de dentro", de profundezas insondáveis. Do samskara quem sabe?) Mas posso aperfeiçoar minha resiliência, minhas habilidades. Não me deixar afundar nem me afogar no mar revolto da mente borderline.
A ideia é sempre a mesma: surfar. A arte de pairar acima da onda. Resistir imóvel e fixa à passagem do turbilhão não é opção. Dar as costas e tentar fugir também não. A única atitude lúcida é fazer como os surfistas: olhar de frente, avaliar o tamanho e a corrente, remar na direção da montanha líquida, escalar a parede e se posicionar o melhor possível pra ir junto e ter controle de si em cima de uma massa e energia avassaladoras.
Como no surfe, tem as quedas, o caldo. Quando a manobra dá errada, não há como não sentir o impacto da onda e não ser arrastada por ela durante um certo tempo e distância. Às vezes os acidentes podem ser bem sérios.
Como no surfe, quando a manobra dá certo, quando é perfeita... uau!!! Aí sim. Que sensação de liberdade, de autodomínio, de unicidade com o ambiente.
Essa é uma parte da alegoria.
A outra parte tem a ver com as profundezas insondáveis onde minha mente borderline produz as ondas. A meta ambiciosa obviamente é mar calmo, sem ondas gigantes.
Uma coisa de cada vez. Ou não. Tudo ao mesmo tempo, porque as coisas acontecem ao mesmo tempo, mas com sabedoria para não tentar atropelar etapas ou fugir delas. Antes de desfrutar de um mar calmo, ainda terei muita onda pra surfar. E pode ser maravilhoso. Surfar bem é uma maravilha.


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