domingo, 29 de outubro de 2017

Caminhos

Sou budista. E batuqueira.
Reencontrei a Nação aos 19, 20 anos de idade, muito antes do budismo. Amor pra toda vida. Essa vida e muitas outras com certeza.
Filha de Oxum Pandá. Sempre disseram que meu ajuntó era com Xangô Aganju, mas não mais agora. E realmente me sinto mais identificada com Oxalá Bocum.
Praia.
Cabeça grande.
Sempre, sempre, as rezas de minha mãe e do Babá foram as que mais me emocionaram e empolgaram, embora eu entre na roda na abertura e fique até o fim.
Depois de três décadas indo e vindo, encontrei uma solução pacífica para viver meu amor pela Nação e por Oxum. Vou nas festas, giro na roda, canto, danço, ofereço flores e ebós - mas não faço obrigações. Para mim a obrigação é inviável. Não consigo aceitar o sacrifício. Não está em mim. E tenho a mais absoluta certeza de que meus orixás não precisam disso e não querem. Ou ao menos aceitam minha decisão - e me aceitam como sou.
Não como carne vermelha desde os 18 anos. E como pouco peixe e frango. Sou mais ou menos vegetariana basicamente pela compaixão, por ahimsa. Mas me faz revirar os olhos o discurso que critica o sacrifício na religião como "oh, que horror!" da parte de carnistas. Me poupem. Horror é a matança nos abatedouros, a crueldade com que os animais são criados e mortos unicamente pra consumo. Também me choca que a esmagadora maioria dos budistas (porque eu sou budista - também) coma carne e ache que isso não é problema desde que não matem os animais pessoalmente. Eu acho muito, muuuuuito mais digno e aceitável comer a carne do animal que se abateu pessoalmente.
Não gosto dos sacrifícios. Não faço. Não faria. Mas para mim mais grave é a indústria da carne. Em todos os sentidos. A começar pelo espiritual. Porque acredito na intenção, na motivação subjacente a cada ato. Além disso, o número de animais abatidos para consumo é milhões de vezes maior que os sacrificados em rituais religiosos. Eu preferiria que nada disso ocorresse. Minhas aspirações budistas são nesse sentido.
Por que tenho uma conexão tão intensa com uma religião que faz sacrifícios não sei exatamente. Mas tenho duas ideias.
Talvez porque a Nação seja bem menos misógina que todas as outras religiões - inclusive o budismo. Mulheres e homens são iguais, mães de santo dispõem do mesmo poder que pais de santo.
A Nação também é bem menos homofóbica e transfóbica. A identidade de gênero, a orientação sexual ou o que seja não impedem o acesso à religião e a evolução espiritual. Os orixás não estão preocupados com a vida sexual das pessoas nesse sentido.
Nada é mais importante para mim hoje do que a igualdade de gêneros. É básico em termos de tolerância, de respeito à diversidade.
O resumo de momento é o seguinte: o budismo é meu caminho porque acredito na vacuidade e na liberação, mas a misoginia me afasta. A Nação faz parte do meu caminho pelo respeito à diversidade e o culto às forças do universo, mas o sacrifício me afasta. Sigo num caminho do meio entre ambos. Buscando as minhas verdades. Pensando pela minha mente. Testando o que me serve e o que não me serve.

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