Várias vezes, inclusive aqui no blog, usei as expressões "andar sobre gelo fino" e "nervos expostos" para definir minha autopercepção.
Em leituras sobre o transtorno de personalidade borderline, vi o uso de duas alegorias análogas: "andar em terreno movediço" e "queimadura de terceiro grau".
São imagens que definem perfeitamente três dos piores sintomas do TPB: a instabilidade e oscilação extrema do humor, a insegurança na vida e a intensidade exacerbada com que sentimos as coisas.
O que eu faço para não afundar no gelo ou na areia movediça e para proteger os nervos expostos e o tecido queimado?
- Terapia e medicação. Para mim a terapia é mais importante que a medicação, talvez porque eu não tenha o transtorno em grau elevado. O fato é que eu jamais aceitaria me tratar apenas com remédio. Eu não quero suprimir os sintomas, eu quero curá-los, ou pelo menos aprender a manejá-los.
- Evito os gatilhos, as situações de perigo. Aprendi a identificar gatilhos na terapia. Antes eu ia atrás desses gatilhos muitas vezes. Aprendi a me manter longe deles.
- Prática esportiva. Há décadas a atividade física é um fator crucial para a manutenção da minha saúde mental/emocional (além da física). Tenho que treinar. Muito. Sempre. Não é opcional. Quando a manifestação do TPB se exacerba, sempre vem a falta de vontade de treinar. Recentemente tive um longo período, longo mesmo para os meus padrões, de desânimo, má vontade e total falta de vontade em relação aos treinos, iniciado em 2013. (Não por acaso, o ano em que internei minha mãe na derrocada final do Alzheimer no primeiro semestre e meu treinador, que havia me reabilitado depois da cirurgia de hérnia de disco e me ajudado a voltar a correr bem, deixou de atuar no segundo semestre. Para a borderliner aqui, dois eventos devastadores.)
Foi (e continua sendo) difícil retomar. No ano passado encontrei um treinador cuja paciência e persistência estão contribuindo de forma decisiva para que eu volte a gostar de correr e, mesmo antes disso (ou quando o gostar inexiste), treine com regularidade e cumpra a planilha, ainda que aos trancos e barrancos, ainda que eu esteja uma lesma.
No início deste ano, tive outra ideia magnífica para alavancar a prática esportiva: migrei da musculação sozinha em academia (que simplesmente tornou-se insuportável) para o treinamento funcional assistido, com horário marcado. A borderliner aqui sente-se cuidada pelos vários professores em sala, que corrigem tudo, estão atentos a tudo e parabenizam pelos pequenos progressos (cuidado e validação, temas tão sensíveis para borderliners). Além disso, o horário marcado (e a grana que eu gasto) me força a sair de casa mesmo quando não estou a fim.
Cada treino, cada corrida, por mais sofridos que sejam, por maior que tenha sido a má vontade prévia, me proporcionam gratificação. Me sinto bem fisica e emocionalmente, satisfeita comigo mesma por ter superado a minha tendência para a autossabotagem.
- Meditação tem ajudado muito. A meditação da atenção plena, mindfulness, estimula a permanência no momento presente e a observação aberta do que acontece. Comecei a meditar há três meses, quase nada, mas já consigo trazer a atenção plena para o cotidiano em alguns segundos. Quanto mais presente me mantiver no presente, menos estarei nas ruminações sobre o passado ou nas preocupações sobre o futuro, que para os borderliners têm uma intensidade excepcional. Mantendo-me no presente, posso usar essa intensidade intrínseca para ficar muitíssimo feliz com coisas prosaicas. O trabalho do dia bem feito, um treino bem feito, atividades culinárias, a observação da paisagem, o céu, as flores, as árvores.
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Que seja de benefício.
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