domingo, 28 de setembro de 2008

Observação da paisagem

Na semana passada, vi um antigo objeto de desejo/apego. Foi um acontecimento totalmente fortuito, irrelevante em termos práticos, mas causou uma ventania semelhante à que agitou a cidade nesse início de primavera.
A mente cavalga sobre ventos, diz Lama Yeshe no livro que traduzi. E minha mente esteve prestes a sair ventando sabe-se lá por quais veredas, como o cavaleiro da história budista ali embaixo, que se deixa conduzir pelo cavalo desembestado. Mas não dessa vez. Fiquei firme em meio à ventania, puxei as rédeas e fiz o cavalo ir a trote para poder observar a paisagem e decidir um rumo. Essa tem sido uma experiência de observação do apego/desejo.
Percebi que não tenho apego pelo ex (e deve ser por isso que nunca tive ciúme, coisa que sempre me intrigou), e sim pela experiência pessoal, interna, de que desfrutei em função dele. Ou seja, é um apego por determinados tipos de ventos... Concluí que não sinto falta do ex, mas dos ventos, das sensações. E essas sensações sob certo aspecto independem dele, são projeções de minha mente, que atribuiu características a uma base. A famosa imputação, ou rotulamento, dos fenômenos pela mente dualista.
O que me manteve apegada a essa experiência específica sempre me pareceu maior do que uma mera vertigem samsárica. Vi possibilidades de usar esse relacionamento - ou as sensações que ele me proporcionava - na prática budista. Usar a energia do desejo de modo positivo. Espero descobrir se tenho como fazer isso.

sábado, 27 de setembro de 2008

Quem leva quem

Um homem está à beira da estrada, e de repente vê um cavalo aproximando-se num galope desenfreado. Ele pergunta ao cavaleiro: "Aonde você vai com tanta presssa?" Este responde ao passar: "Não sei, pergunte ao cavalo!"
Historinha clássica do budismo para ilustrar a agitação mental. Ou aprendemos a controlar a mente, ou somos levados de arrasto por nossos padrões baseados na ignorância, desejo e ódio, os três venenos principais, as fontes de toda lambança.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Samsara noturno

O tantra compara as experiências de morte, bardo e renascimento às de sono, sonho e despertar. Eu estava relendo sobre isso ontem, ao revisar a tradução do livro de Lama Yeshe.
E eis que minha noite foi agitada por três sonhos, o primeiro deles muito perturbador. Há um tempo, um sonho como esse causaria a sensação de pesadelo. Mas agora não mais. Durante o sonho e ao despertar, consigo manter um nível de calma e lucidez que evitam a sensação de sufoco, de estar sendo levada de roldão. A experiência se desenrola, mas consigo manter certo controle sobre ela, e principalmente sobre mim. Meu autocontrole é experienciado como destemor, eu simplesmente olho a situação, decido o que fazer e parto pra ação sem hesitar. Há um distanciamento emocional, eu não me deixo levar pelas sensações de aflição e medo. O termo que me ocorre é frieza, mas não me parece exato. Talvez firmeza.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Eu no meu pior

Minha pessoa e minha prática espiritual melhorariam muito se eu não dirigisse. Meu comportamento no trânsito é uma vergonha. Não tanto nas ações de corpo (deve ser porque não ando armada...), mas nas de fala e mente... que desastre! Os ventos tornam-se um furacão de impaciência e ódio.
Estou há anos tentando melhorar, mas que dificuldade. Zero paciência. Tento recitar mantras pra ficar mais centrada, e um dia desses interrompi a recitação pra xingar um motorista. Francamente... Mas essa foi tão de última que desde então estou mais pacífica. Ou seja, dois dias.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Lunática

Agora meu blog está equipado com um link para as fases da Lua.
Vi isso de manhã no site do Instituto Caminho do Meio, do meu lama. Aí fui atrás pra colocar aqui também, porque sou ligada na Lua e sinto nitidamente sua influência em minha vida.
Ontem de noite saí rapidamente pro pátio e dei de cara com uma Lua enorme, branca e brilhante acima de minha cabeça. Foi um momento de pureza, eu havia acabado de lavar a cabeça e me senti inundar de luar.
As últimas semanas foram tão tumultuadas que eu havia esquecido da Lua - sem falar do tempo encoberto, que acaba desviando meu olhar do céu. E ontem, depois de uma manhã ensolarada e radiante, topei com a Lua a cintilar por cima do meu telhado.
Fase de expansão, de colheita.

domingo, 14 de setembro de 2008

De cabeça feita

Acordei às 6h30 espontaneamente. Se estivesse cansada, não iria correr. Mas percebi que estava desperta e disposta. Cobri a cabeça e fui. Afinal, tudo que fiz nas últimas três semanas é exatamente para isso: para me agilizar e me soltar. Para me governar.
Fiz a coisa certa. E corri bem num lindo dia de sol.
Minha filha foi comigo, e isso só aumentou a sensação de plenitude.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Rainha das Dakinis

Essa é Vajrayogini, ou Vajravarahi, consorte de Heruka Chakrasamvara e a mais importante das dakinis tântricas. Ela é Sarva-buddha-dakini, a dakini que é a essência de todos os Budas.
Vajrayogini é de cor vermelha radiante, seu corpo arde com o calor da chama yogue e está cercado pelas labaredas da sabedoria. Seu cabelo revolto cai solto pelo pescoço e costas; seu rosto tem uma expressão semi-irada. Ela está nua, adornada com ossos humanos. Seu colar de crânios corresponde às 16 vogais e 34 consoantes do alfabeto sânscrito, simbolizando a purificação da fala.
Na mão direita ela segura uma faca de tosquiar com um punho de vajra - um cutelo vajra - que usa para cortar os apegos. Na mão esquerda ela traz uma taça de crânio cheia de sangue ou mahasukha (a grande bem-aventurança), que serve como vinho a seus devotos. Sobre o ombro esquerdo ela apóia um khatvanga ou cajado mágico. Ela dança em cima de dois cadáveres, o que representa seu domínio sobre o ego e a ignorância.
Vajrayogini com freqüência é associada ao triunfo sobre a ignorância e sobre os excessos. Sua prática é considerada muito adequada para aqueles com forte apego desejoso.
Vajrayogini é uma deidade de meditação tântrica. Ela simboliza:
- o aspecto feminino plenamente iluminado, indômito, ardente e energético de um Buda (shakti/kundalini);
- o aspecto de sabedoria que conduz ao estado de Buda;
- como dakini, é a guia compassiva e apaixonada e o aspecto inspiracional que conduz o praticante à iluminação.

Dakinis são a representação feminina da energia iluminada. Em tibetano, o termo é khandroma, que significa aquela que atravessa o céu, ou aquela que se move no espaço. A tradução poética é dançarina dos céus, ou andarilha dos céus. As dakinis dançam no céu azul e límpido de shunyata, a vacuidade.
Dakini é a energia em movimento na vacuidade, que é a base de onde brotam e onde se dissolvem todos os fenômenos.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Uma coisa só

Vajradhara é a palavra budista de que mais gosto. Ou a que mais gosto de dizer, aquela que mais ocupa minha mente, isso em termos de surgir do nada, de brotar espontaneamente. Quando vi o termo vajradhara pela primeira vez tive o clic. Naquela ocasião, vajradhara não referia-se ao Buda Vajradhara, mas era o título honorífico de um guru de grande realização.
O mais notável é que antes de conhecer a palavra eu já conhecia uma representação de Vajradhara e sua consorte Vajradhatvishvari - essa ali de cima, aqui em detalhe:E essa imagem me tantaliza na mesma medida que as representações de Samantabhadra e sua consorte Samantabhadri. Para mim o budismo é essencialmente Samantabhadra e Vajradhara.
Eu só uni a palavra vajradhara à deidade Vajradhara um dia em que estava com meu lama e mostrei a imagem a ele e perguntei se poderia ser Samantabhadra, como dizia no site de onde a capturei. O lama disse que não, pois Samantabhadra (ou Kuntuzangpo) é sempre representado nu e sem adornos. Ele disse que provavelmente tratava-se de Vajradhara, mas não entramos em muitos detalhes. Ele apenas disse que no fundo Samantabhadra e Vajradhara são a mesma coisa, o Buda Primordial.
O assunto ficou por isso até hoje, quando, por ter resolvido postar algo sobre Heruka Chakrasamvara, acabei me entretendo a olhar imagens e aí fui ler mais sobre Vajradhara (também mencionado no livro de Lama Yeshe que estou traduzindo).
E então pela primeira vez caiu a ficha: a palavra que vivo repetindo e as imagens que mais admiro e volta e meia estou olhando são tudo a mesma coisa!!! Extraordinário, como diz meu amado lama.

Devaneio crepuscular

Ao entardecer é comum me bater uma melancolia, uma nostalgia, uma languidez, uma saudade... É a sensação mais difusa que conheço, porque não se refere a nada nem ninguém especificamente. A sensação manifesta-se espontaneamente, às vezes associada a alguma pessoa com quem eu esteja envolvida de momento, mas é muito mais profunda. Talvez seja melhor dizer que é muito mais antiga do que qualquer coisa ou pessoa de que eu me lembre. Parece uma sensação ancestral.
Esse devaneio é a essência do intangível em mim.
Vontade de estar em casa. Mas que casa?
Bem, em termos materiais tenho o bom karma de morar em um lugar de que gosto muito. Hoje, quando veio a sensação, fui pro terraço e fiquei esparramada numa cadeira, cercada por meus gatos e minhas plantas. É a minha casa nesse momento dessa vida. E é uma casa onde me sinto confortável, tranqüila. É a primeira casa de que gosto nessa vida. A primeira casa onde me sinto em casa. Mas ainda não é "a" casa, creio.
Tenho a sensação de que "a minha casa" ficará perto d'água. Não sei de rio ou mar. O que sei é que, sempre que me sinto desanimada ou superficialmente infeliz, tenho vontade de ir pra perto d'água. Em geral tenho vontade de pegar o carro e ir pra Ipanema pela avenida à beira-lago. Já fiz isso algumas vezes. Simplesmente vou até lá, fico uns minutos e volto. Preciso olhar a água, uma grande massa líquida.
Outras vezes sinto um desejo imenso de ir olhar o mar. Nunca fui porque aí é muita mão, muito gasto, muito tempo... Além disso, o mar ideal está ainda mais longe que o de Pinhal ou Tramandaí. É o mar da Massambaba, perto de Cabo Frio. Praia aberta, mar grosso, revolto, gelado. E azul. Nesse vídeo a Massambaba está bem mais dócil do que no dia em que a vi.

Heruka Chakrasamvara

Estou traduzindo um livro de Lama Yeshe sobre práticas tântricas. Heruka Chakrasamvara era a deidade principal de Lama Yeshe. Embora eu tenha um conhecimento extremamente limitado, ADORO as imagens tântricas.
Nessa, Heruka Crakrasamvara, deidade irada, de cor azul, com doze braços e três rostos, está abraçado e em união sexual com sua consorte Vajravarahi, de cor vermelha. Ele veste uma pele de tigre, de pé em meio a chamas de sabedoria, e pisoteia dois cadáveres.
Heruka segura vários atributos nas mãos, simbolizando suas perfeições mágicas. Os dois braços principais seguram o vajra e o gantha (cetro e sino), demonstrando que ele superou a dualidade.
Como uma emanação do Buda Akshobhya (elemento água), a deidade transforma a energia do ódio em sabedoria iluminada.
Acima de Heruka Chakrasamvara estão os bodhisattvas Manjushri, Chenrezig e Vajrapani; abaixo, Paldem Lhamo, a Deidade Protetora de Heruka e os esqueletos dançarinos Citipati.
Que possa ser de benefício!